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domingo, 17 de outubro de 2010

A eficácia dos antidepressivos

Um artigo publicado em 2008 na PLoS causou certo tremor na comunidade científica, pois apontou que os antidepressivos da quarta geração, que incluem fluoxetina, venlafaxina, nefazodona, paroxetina, sertralina e citalopram, considerados inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS), não teriam efeito superior ao placebo.

O estudo consistiu em uma meta-análise (um estudo sobre dados já publicados) que englobou 35 estudos quase-experimentais analisou parâmetros estatísticos relevantes (como variância, desvio-padrão e diferença entre as médias), abrangendo 3.292 pessoas no grupo-teste (com utilização de um dos medicamentos) e 1.841 no grupo controle (com placebo). O que é especialmente interessante na análise conduzida por Irving Kirsch e equipe foi a fonte dos dados.

A indústria farmacêutica norte-americana deve submeter todo e qualquer estudo realizado ao Food and Drug Administration (FDA), que é o órgão controlador dos medicamentos nos Estados Unidos - mesmo (e principalmente) os estudos que não demonstram eficácia da medicação. Desta forma, estes dados provavelmente possuem pouco ou nenhuma tendência (viés) a aumentar os efeitos das medicações, mas demonstrar os efeitos que realmente foram identificados.

O artigo de Kirsch et al. demonstrou que os participantes dos grupos-teste destes 35 estudos não apresentaram mudanças superiores em relação aos pacientes dos grupos controle, a não ser os pacientes que apresentavam depressão grave. Entretanto, mesmo para estes, Kirsch et al. argumentam que o que houve não foi, efetivamente, um aumento da eficácia dos medicamentos, mas sim uma diminuição do efeito placebo, que cria a ilusão de que os efeitos dos medicamentos foram maiores.

O estudo, bem conduzido do ponto de vista metodológico, aponta para uma valorização do trabalho do psicólogo, visto que se as medicações realmente são pouco eficazes, o que faz a grande diferença no tratamento da depressão é a psicoterapia.

Uma entrevista de Irving Kirsch pode ser lida aqui.

6 comentários:

Daniel F. Gontijo disse...

Se bem entendi, o efeito placebo estaria ausente -- ou seria muito pequeno -- em pacientes com depressão grave, e portanto o efeito do remédio sobressairia. Então, nesse tipo de situação (pacientes com depressão grave), não seria interessante a administração do fármaco (sem descartar a importância da psicoterapia)?

Vinícius Ferreira disse...

Oi Daniel,

O que parece ocorrer na depressão grave, pelo estudo de Kirsch et al., é uma diminuição do efeito placebo. Esta diminuição "ressaltaria" o efeito do medicamento, o que não quer dizer que ele seja realmente mais eficaz nestes casos. Não é que a medicação teria um efeito maior, mas sim que o placebo teria um efeito menor.

Obrigado pelo comentário. Abraço e ótima semana.

Anônimo disse...

Lhe cumprimento por retornar a este assunto tão importante e que,à epoca, não foi muito badalado pela mídia(por que será?...). Aqui no Brasil, da grande imprensa, apenas a revista Época (http://revistaepoca.globo.com/Revista/Epoca/0,,EDG82052-8055-511,00-O+VALOR+DA+TRISTEZA.html) e o site da BBC Brasil(http://www.bbc.co.uk/portuguese/reporterbbc/story/2008/02/080226_antidepressivoseficacia.shtml) repercutiram.
Já no exterior: site da Natural News.com (propõe medicina mais natural) (http://www.naturalnews.com/z022723.html); a APA (http://www.apa.org/news/press/releases/2002/07/antidepressants.aspx) e a WebMD (com o contraditório dos fabricantes) (http://www.webmd.com/mental-health/news/20080227/antidepressants-no-better-than-placebo).
Tomara que essa metanálise não caia no esquecimento.
Abr.
Fernando

Vinícius Ferreira disse...

Acredito que algumas informações complementares sejam úteis em relação ao que está sendo discutido.

A meta análise conduzida por Kirsch et al. foi boa do ponto de vista metodológico, e restringiu-se aos inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS), que inclui a fluoxetina. Outros antidepressivos não foram considerados neste estudo.

Segundo ponto, o instrumento utilizado para avaliar a depressão foi a escala de depressão de Hamilton, que consiste em 21 questões. O instrumento avalia sintomas depressivos, e não considera no enunciado um período de tempo (por exemplo, as duas últimas semanas, como o BDI), mas sim os sintomas apresentados no momento da resposta ao questionário. Isso pode significar que o respondente apenas avaliou os sintomas depressivos do dia em que está respondendo. Em email enviado ao autor, ele ressalta apenas que os estudos utilizaram a escala de depressão de Hamilton para avaliar os sintomas e que os pacientes não tiveram, nestes estudos, acompanhamento psicoterápico.

Terceiro ponto (e esse é um ponto relevante), não sei como procedeu-se o diagnóstico de depressão, nem SE foi realizado. O que tenho observado é que podem haver discrepâncias na realização do diagnóstico. Isso significa que pode-se questionar um diagnóstico de "depressão", visto que sintomas depressivos podem aparecer em diversos quadros. Fico me questionando quantos dos pacientes que participaram do estudo realmente têm diagnóstico de depressão, ou somente sintomas depressivos.

Finalizando, também tenho dúvidas a respeito destes achados, visto que a prática clínica têm demonstrado melhoras em pacientes com depressão que utilizam a medicação. Mas há outros aspectos metodológicos (na condução dos estudos pelas indústrias farmacêuticas) que permanecem pouco claros.

Abraços a todos.

***Lú **** disse...

Olá Daniel, sou usuária do citalopran e estava lendo sobre o tema e acho q na minha situação pelo fato de ser portadora de EM, ele tem um efeito positivo em mim.Falo isso pelo fato q fiquei sem esta semana e pra ser sincera me sinto uma manteiga derretida, qq coisa é motivo para chorar.Pode ser q eu esteje em um estágio um pouco mais elevado de depressão sei lá.....
Só queria dizer isso, e apartir de agora vou estar mais ligadas a este assunto.

Obrigada pelo espaço.
Abraços

Vinícius Ferreira disse...

Olá Lu,

Obrigado por sua visita ao blog e seu comentário. Espero que volte sempre e contribua com as discussões.

Abraço.