Pós-graduações IMED 2013

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quarta-feira, 28 de novembro de 2012

A necessidade de renovação


A capacidade de adaptação ao ambiente é uma das propriedades dos seres vivos. Esta habilidade permite que o organismo e as espécies se ajustem às mudanças ambientais normais e esperadas, tanto quanto àquelas que não estão previstas. Sem a capacidade de adaptação e mudança, os seres vivos estariam extintos.


No caso dos seres humanos, há uma combinação fina e complexa entre a adaptação e a capacidade de mudança. Pela nossa herança evolutiva, possuímos uma forte tendência a nos ajustarmos comportamentalmente a uma determinada situação, e após este ajuste não temos muito interesse em fazer novas mudanças de comportamento. Do ponto de vista cognitivo essa estabilidade é importante, pois nos garante certa permanência de respostas de comportamento: se um comportamento funcionou bem no passado, por várias vezes, ele possui boa probabilidade de funcionar bem em situações semelhantes no futuro. Isso explica, em parte, porque é tão difícil mudar velhos hábitos, especialmente se eles foram bastante reforçados.

Mas a mudança é necessária, e periodicamente ela mostra suas exigências. Ela é o indicador inequívoco de que a natureza, o mundo, as pessoas não são estáticos, e isso exige sempre, em alguma medida, uma resposta do organismo. Essas mudanças podem ser superficiais, como as coisas simples do dia a dia como comprar uma roupa nova, ou podem ser essenciais e marcantes; essas exigem os esforços mais profundos e causam as dores mais significativas, porque provocam uma revisão na forma como nos comportamos, como vemos as coisas. Mudanças assim são dolorosas, e por isso acabamos adiando, resistindo, negando.

Estamos novamente nos aproximando de um período que tradicionalmente as pessoas reveem seus comportamentos, conceitos e expectativas sobre a vida. É um momento no qual a mudança pode acontecer mais facilmente porque existe uma sensibilidade para a avaliação e a mudança. Mas estamos falando das superficiais ou das profundas? É uma mudança de visão de mundo? De alguns paradigmas, pelo menos? Os esquemas cognitivos nos dão parâmetros para lidar com o mundo, mas em algum momento eles mesmos necessitam de revisão. Por óbvio que as mudanças superficiais são as mais fáceis, mas as mudanças de referência, de esquema de mundo, são as mais duradouras. O esforço de mudar algum aspecto enraizado de nosso comportamento é grande, mas ele está acompanhado geralmente de bons ganhos.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

O cérebro escaneado


A compreensão sobre o funcionamento do cérebro está prestes a efetuar um avanço gigantesco. Philip Low, da NeuroVigil, construiu em sua tese de doutorado um algoritmo de análise de ondas cerebrais capaz de decodificar o complexo sistema de comunicação entre os neurônios. Saber qual informação trafega entre as diversas redes neurais é fundamental para se compreender o status de funcionamento do cérebro.

O iBrain, como é chamado o equipamento, consiste em alguns eletrodos capazes de receber ondas cerebrais de várias partes do cérebro. A vantagem, em relação a equipamentos tradicionais, é que o iBrain capta o funcionamento cerebral como um todo e após o decodifica com base no algoritmo de Philip. Esta decodificação permite que um computador possa identificar eventos cerebrais distintos, como a representação de "alto" e "baixo", que são fundamentais para a constituição de comandos diversos.



Um dos primeiros candidatos ao uso do iBrain é o físico Stephen Hawking, professor lucasiano de matemática da universidade de Oxford e considerado por muitos o físico mais brilhante após Albert Einstein. Hawking é portador de uma doença degenerativa, chamada de esclerose amiotrófica lateral, que vem progressivamente eliminando sua capacidade de movimento. Há anos utilizando uma interface que permite sua comunicação através de movimentos oculares, O iBrain pode ser a estratégia que facilitará a Hawking a comunicação, libertando sua mente de sua cada vez mais restrita capacidade de movimentação.

Os avanços tecnológicos permitidos por este recurso irão permitir que, no futuro, pessoas com graves dificuldades de movimentação possam utilizar as ondas cerebrais para comandar próteses, com redução ou sem a necessidade de implantes físicos. Além disso, permitirá um número gigantesco de possibilidades, como o controle à distância de equipamentos diversos.

sábado, 24 de dezembro de 2011

Uma coisa por vez

Aquilo que intuitivamente já sabemos, ou seja, de que precisamos nos concentrar em poucas ou somente uma coisa por vez para fazermos bem-feito, foi comprovado. O neurologista Russ Poldrack, da Universidade do Texas, em Austin, refere que o cérebro humano não é capaz de processar de forma eficiente várias informações simultâneas, mas processa bem poucas informações por vez.


Esta informação tem importante impacto por exemplo no contexto educacional. Muitos educadores têm defendido o uso de tecnologias no processo ensino-aprendizagem durante aulas expositivas. Embora não se questione o mérito da utilização de novas tecnologias, fica em xeque a forma como a aprendizagem ocorre de maneira eficiente. Ou seja: se o aluno estiver numa aula com o computador, tablet ou conectado com outra tecnologia, seu conhecimento pode estar no prejuízo.

A psicologia cognitiva já apontou há vários anos que a atenção é o canal que permite que as informações sejam processadas pelas demais funções mentais, tais como a memória e o pensamento. Quando prestamos atenção em um objeto, ele é o "foco" de nossa análise. Assim, se existem distratores, essa análise acaba ficando a desejar, e o conhecimento não terá a mesma qualidade.

Voltando à sala de aula, o segredo não está na tecnologia propriamente utilizada para a construção do conhecimento, mas na sua forma e no conteúdo. Fica então um alerta: computador ligado em redes sociais, jogos ou outros distratores durante uma aula pode melhorar o relacionamento interpessoal, mas não favorece o aprendizado.

*Sugestão de leitura: Troques da mente, de Stephen L. Macknik e Susana Martinez-Conde

domingo, 30 de outubro de 2011

O Planeta dos Macacos

Planeta dos Macacos: A Origem é uma nova filmagem do clássico de 1968, baseado na obra "La planète des singes" escrito por Pierre Boulle, publicado em 1963, que conta a história de uma possibilidade ao mesmo tempo assustadora e sedutora: o aparecimento de uma outra espécie capaz de pensar como os seres humanos.
Muitos de nós gostariam que surgisse outra espécie capaz de utilizar níveis complexos de pensamento e linguagem de forma semelhante à nossa, permitindo trocas de informações inteligíveis com os seres humanos. Se, através de processos evolutivos naturais ou artificiais, isso ocorresse, seria uma excelente oportunidade para verificar se o processamento da informação desta espécie seria semelhante ao nosso, ou se teria estruturas diferentes. Tanto num caso como noutro, nossa capacidade de compreensão do pensamento aumentaria muito, podendo alçar a psicologia cognitiva a outros patamares.

Por outro lado, essa perspectiva poderia despertar temores primitivos. Como essa espécie se comportaria? Seria capaz de constituir sociedade complexa, com cultura, assim como fazemos? Como expressaria sua agressividade intra e extraespécies? Qual o impacto que isso teria sobre a sociedade humana? Creio ser impossível não se fazer estas questões quando se assiste ao filme.



sexta-feira, 23 de setembro de 2011

O pensamento de Watson

O sistema computacional Watson, da empresa IBM, venceu recentemente um programa americano de perguntas e respostas, mostrando que a capacidade computacional está se aproximando do processamento humano da informação.


Esta não é a primeira vez que a máquina vence o cérebro num desafio. Em 1996, o computador DeepBlue, também da IBM, venceu Garry Kasparov em partidas de xadrez. Mesmo imerso em polêmicas, estas partidas mostraram que o computador era perfeitamente capaz de processar informações de forma semelhante, nos resultados, ao cérebro humano.

Na revolução industrial, as máquinas substituiram a força humana, ampliando de forma gigantesca nosso potencial físico. O pensamento humano foi, por muito tempo, considerado algo que as máquinas jamais conseguiriam simular, pelo menos o processamento mais elevado ou mais complexo. Entretanto, a cada dia a tecnologia está demonstrando que esse limite está mais perto.

sábado, 2 de julho de 2011

O pensamento além do cérebro

O cientista Miguel Nicolelis, renomado pesquisador em neurociências, realizou um experimento que abriu as fronteiras para uma nova era do conhecimento sobre o cérebro. Ao estudar primatas não-humanos, ele conseguiu, através de um experimento inovador, registrar o pensamento e modelar o funcionamento de um braço mecânico. Desta forma, ligou de maneira inédita, o cérebro humano às máquinas.

Sem entrar na discussão ética desta ligação, que certamente fará parte do debate futuro dos filósofos e cientistas, este experimento marca uma nova fase sobre o que conhecemos a respeito do cérebro humano. Teremos próteses capazes de responder diretamente ao cérebro, sem que o comando nervoso passe pela medula espinal? Possivelmente. E mais ainda: podemos construir uma era onde o pensamento não estará mais contido no cérebro.

Recomendo o vídeo abaixo, especialmente os últimos minutos.



quinta-feira, 16 de junho de 2011

Manual prático de terapia cognitivo-comportamental

Foi lançado ontem no Auditório Central da Faculdade Meridional / IMED o livro "Manual prático de terapia cognitivo-comportamental", organizado pelas professoras Margareth da Silva Oliveira e Ilana Andretta.

A obra tem como objetivo apresentar os fundamentos teóricos das Terapias Cognitivo-Comportamentais e exemplos de sua aplicação no cotid
iano da clínica, fornecendo um panorama geral dos modelos de tratamento de diversas psicopatologias.




O livro possui capítulos de autoria dos professores da IMED, Vinícius Renato Thomé Ferreira e Márcia Fortes Wagner, e constitui-se livro-texto para estudantes de psicologia e psicólogos que trabalham com a psicoterapia cognitivo-comportamental.

O livro pode ser adquirido no site da Casa do Psicólogo.

Confira as fotos do evento!





segunda-feira, 13 de junho de 2011

Lançamento do livro Manual Prático de Psicoterapia Cognitivo-Comportamental

A Faculdade Meridional - IMED tem o prazer de convidar a todos para a palestra sobre clínicas-escola e para o lançamento do livro "Manual Prático de Psicoterapia Cognitivo-Comportamental", organizado por Margareth da Silva Oliveira e Ilana Andretta.

sexta-feira, 1 de abril de 2011

Os caminhos dos neurônios

A compreensão dos mecanismos de funcionamento do cérebro é um dos grandes desafios da humanidade.

Uma pesquisa conduzida pelo departamento de neurobiologia da escola médica de Harvard, publicada na revista Science de março deste ano, conseguiu traçar o caminho efetuado pelas conexões de um grupo de neurônios, mostrando quais caminhos os axônios e dendritos seguem para a transmissão das informações.

A pesquisa consistiu na fotomicrografia de centenas de lâminas dos neurônios, e depois na montagem dos caminhos traçados pelas conexões. Apenas um destes circuitos possui entre dez mil e cem mil neurônios, com cerca de dez mil interconexões. Desta forma, é possível alcançar a faixa de um bilhão de conexões neste circuito simples, levantando um enorme problema computacional.

O centro de supercomputação de Pittsburgh, localizado na universidade Carnegie Mellon efetuou o processo de análise e transformação das informações em um mapa 3D, utilizando apenas 10 neurônios.

Ainda é um mistério a compreensão de como os neurônios processam as informações, mas os avanços na área da neuroimagem e da fisiologia dos neurônios nos darão pistas importantes para entendermos como compreendemos o mundo e a nós mesmos.

A notícia completa está disponível aqui.

sábado, 18 de setembro de 2010

O preconceito inconsciente

Todos os dias temos constantemente provas de que nosso comportamento possui raízes irracionais, apesar de nossa racionalidade. Os estudos de Mahzarin Banaji, psicóloga social e professora do departamento de psicologia da Harvard University, têm demonstrado que os preconceitos que temos possuem raízes que desconhecemos.

Estudos com o teste de associação implícia (IAT, em inglês) têm demonstrado que as pessoas, até mesmo as crianças, possuem uma tendência a avaliar de maneira mais favorável pessoas parecidas com elas mesmas, e de forma menos favorável, pessoas diferentes. Isso não significa dizer que temos preconceitos de algum tipo pré-formatados desde a infância, mas sim que temos uma tendência a julgar favoravelmente o que se parece mais conosco. À medida em que vamos crescendo, aquilo que é considerado diferente vai se cristalizando, graças principalmente à ação do meio social. Nesse aspecto, a família possui uma força importante para a constituição sobre o que é ou não diferente.

Compreender estes fenômenos pode nos auxiliar a entender de que forma organizamos o mundo, especialmente entre o que consideramos aceitável ou inaceitável. São evidentes as aplicações destes estudos por exemplo na diminuição dos comportamentos de bullying entre as crianças e adolescentes.

Uma das principais formas existentes para diminuir o preconceito, segundo Banaji, é a experiência. Quanto mais temos contato e vivenciamos o que é diferente, mais o preconceito tende a diminuir.

domingo, 1 de agosto de 2010

Por que mudar é difícil?

Uma das coisas mais complexas que existem é a mudança duradoura de comportamento. Observamos todos os dias as pessoas, e nós mesmos, dizendo que tal comportamento não nos faz bem e que vamos mudá-lo. Contudo, nem sempre isso acontece de maneira fácil, nem rápida, e é bastante comum que continuemos, após certo tempo, mantendo o mesmo padrão de comportamento. Uma das causas que parece manter a estabilidade do comportamento é o aumento de ansiedade que essa mudança gera.

Por mais que racionalmente compreendamos que tal mudança será benéfica para nós, existe um empecilho: mudar de comportamento significa, primeiramente, analisar o comportamento atual. Aqui começa o problema, pois ao fazer isso, nos damos conta de que muitas coisas importantes que acreditamos na verdade não existem, e isso aumenta o nível de ansiedade. Durante o processo evolutivo, a redução da ansiedade foi um mecanismo importante que colaborou para a manutenção da vida, porque ansiedade em intensidade elevada e/ou por tempo prolongado causa danos ao organismo. Sempre que temos elevados nossos níveis de ansiedade, disparamos mecanismos que tentam reduzir-la, e um dos primeiros movimentos que ocorrem é a tentativa de remoção do estímulo aversivo. Em outras palavras, se começar a pensar sobre nosso comportamento é algo que aumenta a ansiedade, a forma mais fácil de reduzir esta ansiedade é simplesmente parar de pensar.

Vamos imaginar, por exemplo, uma situação de conflito onde a mudança de comportamento seria benéfica: um filho adulto em conflito com a mãe, cuja fonte de atrito é o desejo por parte da mãe de ter o filho mais perto em termos afetivos contra o desejo do filho em ter mais autonomia. Quando este conflito surge, desperta sentimentos de raiva, ansiedade e desconforto em ambos. Na discussão, cada um demonstrará ter razão, pelo seu ponto de vista (a mãe sente falta do apoio emocional do filho; o filho sente-se pressionado e com sua liberdade ameaçada). Ao fim da briga, ora um cede, ora outro cede: o filho aproxima-se da mãe novamente, em termos afetivos, e a mãe, por sua vez, dá um pouco de espaço para o filho, por algum tempo. Desta forma, a ansiedade é aumentada, num primeiro momento, e depois reduzida a níveis suportáveis para ambos. Entretanto, outras brigas virão, porque a fonte que está provocando a ansiedade não foi tocada.

Mas o que aconteceria se um destes dois protagonistas começasse a pensar na relação que tem com o outro, sobre seus comportamentos, sentimentos e as consequências disso? Vamos supor que a mãe começa a pensar sobre a criação do seu filho, em como se dedicou a ele e como ele está sendo ingrato ao não corresponder aos sentimentos dela. Isso certamente vai despertar os sentimentos de ansiedade, que pode desencadear a briga, pelo pressuposto: "Aproxime-se de mim, me dediquei a você e agora estou me sentindo mal porque não sinto que você corresponde a tudo o que fiz". Se, ao invés de iniciar a briga, a mãe continuasse pensando sobre as causas de seu desconforto e quais as consequências que isso gera para todos, poderia se dar conta que se dedicou de forma intensa para o filho porque, na verdade, estava se sentindo desvalorizada em outras áreas, como por exemplo, na relação com seu companheiro ou com a sua família de origem. É bem provável que esse tipo de pensamento iria gerar muito mais ansiedade, aumentando o sofrimento já experimentado no presente pela briga.

Por parte do filho, se ele também observasse que a ansiedade que está sentindo quando briga com sua mãe está sendo alimentada, muitas vezes, por comportamentos do passado, teria, assim como ela, aumentado o seu nível de ansiedade. Então, ainda gera menos sofrimento toda a ansiedade produzida pela briga atual do que "mexer" nas coisas que aconteceram no passado e que estão alimentando os conflitos do presente: quando a briga termina, a ansiedade baixou, mas ninguém pensou em tocar na fonte dos problemas. Ou se pensou, não foi forte o suficiente a ponto de mudar seu comportamento de forma significativa.

Então, o que dificulta muito a mudança do comportamento não é falta de capacidade de pensar sobre nossos problemas, mas sim uma espécie de "armadilha" emocional que visa a preservação do funcionamento do sistema nervoso - a evitação dos sentimentos de ansiedade. Sempre que pensar sobre algo gera ansiedade, a primeira reação será combater este pensamento. Como isso geralmente dá certo, podemos compreender então porque é tão comum que as pessoas pensem pouco sobre seus próprios comportamentos e tenham tanta dificuldade de mudá-los. Entretanto, pensar sobre o comportamento e efetuar as mudanças, mesmo que doloroso, tende a trazer a longo prazo mais benefícios, pois os conflitos já compreendidos e trabalhados tendem a exigir menos do sistema nervoso, disparando menos os mecanismos de ansiedade e aumentando a qualidade de vida.

segunda-feira, 25 de maio de 2009

O Cérebro e a Mente

Por mais que os profissionais lutem contra o pensamento cartesiano no estudo do comportamento, é curioso observar como o entendimento da relação entre mente e cérebro ainda está permeada por esta divisão. É muito comum que escutemos em congressos, seminários, leiamos em livros e artigos frases como "É essencial considerar o ser humano como um todo integrado" ou "Não há como separar o comportamento de sua base biológica". Se as pessoas dizem isso com tanta frequência, deve ser porque os profissionais ainda devem ser convencidos que essa divisão não deve acontecer. Isso porque ela acontece na prática.

Um dos pontos em que isso pode ser observado é na descrição usual da relação entre a mente e o corpo. Por óbvio que são coisas distintas, mas inter-relacionadas. Se perguntarmos a um profissional da saúde mental qual a relação entre as duas, dirão, como exposto acima, que não há como dividir, etc. Mas aprofundando o questionamento, os psicólogos parecem pender a balança para algo do tipo "os aspectos emocionais/cognitivos influenciam mais o comportamento" enquanto que o campo médico/biológico enfatiza a "estrutura e funcionamento" do cérebro.

Esse jogo de forças conceitual pode ser facilmente resolvido com o entendimento da teoria da evolução das espécies. A evolução preconiza que as modificações do organismo de uma espécie ocorreram para que ela tenha melhores condições de sobrevivência, e, principalmente, de reprodução. O cérebro e o comportamento de nossa espécie também estão sujeitos a estes mesmos princípios: se hoje pensamos e sentimos da forma como fazemos, isto é produto das forças que delinearam e modelaram o cérebro. E o ambiente social é uma poderosa força modeladora: cérebro e mente co-evoluem a partir das influências ambientais, entenda-se, influências da sociedade, que é o ambiente humano natural.

Quanto melhor este tema for debatido nos cursos de formação, mais condições teremos de realmente superar a ponte que separa essa dicotomia cartesiana. Mas isso somente poderá ocorrer se os professores também conhecerem a teoria da seleção natural.

domingo, 29 de março de 2009

Os dois cérebros

É impressionante o relato da neurocientista norte-americana Jill Bolte Taylor sobre a experiência de um acidente vascular cerebral (AVC) hemorrágico. Ela acordou um dia e percebeu que estava tendo um derrame, e esta experiência proporcionou-lhe uma visão bem distinta sobre o funcionamento do cérebro e a relação entre os hemisférios esquerdo e direito.

De forma sucinta, o hemisfério esquerdo processa as informações relacionadas com os componentes racionais-cognitivos, enquanto que o hemisfério direito realiza a integração de outros estímulos, não-racionais. A integração entre estas duas partes permite que nós nos relacionemos com o mundo como fazemos.

Entretanto, a experiência vivida por Taylor mostra como seria se nossa parte esquerda, racional, fosse "desligada" momentaneamente. O aspecto racional da análise das coisas seria fortemente suprimido, e o lado "sentimental" tomaria predominância na forma como percebemos e nos relacionamos o mundo.

Pode-se dizer que a descrição da experiência se aproxima de uma experiência mística; são relatados sentimentos de perda do "eu" e uma sensação de unidade com o Universo. Portanto, é interessante questionar se a predominância do funcionamento do hemisfério direito poderia favorecer as experiências religiosas.

O conteúdo da experiência de Taylor pode ser visto aqui.

quinta-feira, 18 de outubro de 2007

O software mental

Muitas vezes a mente humana foi comparada a um computador. Guardando as devidas proporções, ela é de fato um órgão computacional, responsável pelo gerenciamento das informações produzidas pelo corpo e por ela própria. Entretanto, por mais complexa que a mente seja, é um produto da evolução do cérebro, seu órgão-sede.

De forma diferente de um programa de computador, mente e cérebro foram se auto-organizando com o processo da evolução da espécie humana. Ao longo das eras, percebe-se uma organização cada vez mais complexa, desde os organismos do reino monera até os animais, passando pelos reinos protista, fungi e vegetal. Quanto mais complexo o organismo se torna, buscando nichos diferentes de subsistência, maior é a necessidade de uma estrutura que receba adequadamente as informações exoceptivas e proprioceptivas e processe-as com agilidade e precisão. Podemos dizer que no organismo humano a mente não necessariamente é tão precisa assim nos processos perceptivos, mas de longe possui uma habilidade que nenhum outro organismo possui: a flexibilidade para o processamento da informação.

Mecanismos mentais como os sentimentos, os processos lógicos de raciocínio e tomada de decisões são resultados do processo evolutivo da espécie humana que, de alguma forma, proporcionaram pequenas vantagens evolutivas, e em vista disso permaneceram. Desta forma, estrutura (cerebral) e função (mental) foram modelados pelas contingências da sobrevivência e se adaptaram mutuamente. Podemos então dizer que, se o cérebro é uma espécie de "computador", é de um tipo muito especial, pois hardware e software foram se constituindo simultaneamente.

A psicologia, neste sentido, pode ser vista como engenharia reversa, buscando identificar, a partir das funções desempenhadas pela mente, a finalidade que esta função desempenhou ao longo do processo de evolução da espécie humana e que favoreceu a luta pela sobrevivência. Esse conhecimento é de utilidade fundamental para a psicologia clínica, visto que é pela compreensão da estrutura de funções como auto-estima, apego, egoísmo e altruísmo que se poderá compreender o estabelecimento de transtornos mentais.

quinta-feira, 20 de setembro de 2007

A psicologia "de dentro" e "de fora"

A psicanálise nasceu dos esforços de Freud para compreender um transtorno chamado de histeria. Abandonando a hipnose, precisou criar outro método de tratamento e investigação que a substituísse de forma satisfatória. Formulou o princípio da associação livre, e como desdobramento deste, o da transferência. Analisou os sonhos dos pacientes, coisas que antes eram consideradas uma espécie de "lixo" psíquico, e criou uma nova disciplina, que chamou de psicanálise.

A psicologia acadêmica tinha outros propósitos. Preocupada em analisar o comportamento humano pelos métodos das ciências naturais (observação e experimentação controlados), amadureceu como ciência graças às contribuições de Skinner no século XX. O behaviorismo influenciou, e influencia ainda, a educação, e propõe que são os elementos ambientais aqueles que modificam o comportamento.

Freud e Skinner: dois gigantes. Um enfatizando a dimensão pessoal, intrapsíquica, e o outro, o ambiente. Cada um de um lado de um precipício. Seus seguidores, mais talvez do que eles próprios, se ocuparam mais em garantir que esse fosso continuasse como estava. Seria possível, ou desejável, encurtar essa distância? A quem seria bom que isso acontecesse?

Os avanços na neurociência e o nascimento da psicologia cognitiva podem criar as pontes necessárias para aproximar estas bordas. Embora muito ainda reste por ser feito, alguns esforços incipientes estão mostrando que a divisão exterior-interior é arbitrária, conceitual, e pode tanto ser mantida como pode ser eliminada. Não é suficiente uma teoria que seja "exclusivamente" clínica, nem "exclusivamente" teórica. Enquanto se pensar assim, sem a construção de pontes, os maiores prejudicados são aqueles que deveriam ser os beneficiados.

sábado, 7 de julho de 2007

Corpo e mente (III): Olá... tem alguém em casa?

A consciência é ainda um grande mistério, embora grandes avanços tenham sido feitos no seu estudo. Ela é um fenômeno abrangente, que permite tanto o reconhecimento sensorial do mundo quanto o reconhecimento de nós mesmos, de nossa identidade para nós e para os outros. Mas mesmo sendo abrangente, a consciência não é capaz de lidar com algumas informações (que acabam por ser, por definição, inconscientes), como por exemplo a secreção glandular, o fluxo sanguíneo e a lubrificação das articulações. Ou alguém tem consciência disso?

Mesmo os níveis elementares da consciência já despertam nosso assombro, que é aquele bom e velho conceito de consciência como "estar ciente de", como por exemplo o som de uma música ou a visão de um belo carro. Como é possível que uma meia-dúzia de estímulos físicos sejam capazes de sensibilizar nossas terminações nervosas, que acabam traduzindo isso em impulsos que são levados ao cérebro? E como é possível que estímulos nervosos sejam "montados" e gerando uma imagem, com cores, texturas, bordas, sensação de distância num emaranhado de células?

O pior do problema não é isso, mas é a "outra" consciência, aquela que me diz que eu sou eu, que eu sou diferente de você, e que, quando acordo, sei que sou eu, o que fiz ontem e anteontem, que sou do sexo masculino e que sou psicólogo. Compreender como organizamos nossas informações sensoriais já é uma tarefa gigante; nos defrontar com a pergunta "quem somos nós" é maior ainda.

Volto ao nosso bom e velho senso comum para tentar responder o problema da consciência: ou estamos abordando uma questão complexa demais que pode ser resolvida de forma absurdamente simples, dizendo que é a "alma" que faz o serviço todo, ou então consideramos que estamos diante de um pseudo-problema. Se admitimos que algo chamado "alma" existe, OK, o problema está resolvido, e não pela ciência, mas pela religião. Mas se queremos resolver o problema cientificamente, precisamos de outras explicações que sejam poderosas o suficiente e que possam ser testadas.

Falo que talvez o problema da consciência seja um pseudo-problema porque ele está mal-formulado, e se for assim nenhuma resposta será satisfatória. Talvez a resposta não seja "quem" é a consciência, mas sim que a consciência é uma ilusão, e das melhores. Mas se for uma ilusão... quem somos nós? Não foi identificada uma região que pudesse ser chamada de "a sede da consciência", porque a consciência é composta pela coordenação de diversos processos mentais. Isso quer dizer que é possível modificar e danificar processos que compõem o conjunto chamado consciência, gerando quadros bizarros onde alguém é incapaz de reconhecer a si mesmo num espelho. Portanto, mais do que ser uma região específica do cérebro, ela é o produto do funcionamento simultâneo de diversos processos mentais. E se for assim... quem é você e onde está agora? tem alguém em casa?

sexta-feira, 29 de junho de 2007

Corpo e mente

Quando olhamos o mundo no topo de uma montanha, temos a sensação de que a Terra é plana. Da mesma forma, no nosso dia a dia, no máximo percebemos ondulações como morros ou eventualmente montanhas, mas continuamos com a sensação de que o terreno onde pisamos deve ser plano. Mas se perguntarmos para qualquer pessoa qual é o formato do planeta, ela dirá que é redondo. Por que isso? Afinal, é uma contradição à nossa percepção considerar que o chão que está abaixo de nós é a superfície de uma esfera, que é o próprio planeta, mas mesmo assim sabemos que essa resposta é correta embora não seja o que vemos todos os nossos dias.

Os seres humanos percebem o mundo e as pessoas de uma determinada forma, e nos tranqüiliza pensar que o que vemos é a “realidade”. Mas não nos damos conta de que o que sabemos sobre o mundo na verdade aprendemos de outras pessoas, em muitos casos. Por exemplo, quando somos crianças e perguntamos para nossos pais de onde viemos, nem sempre obtemos uma resposta satisfatória porque a pergunta é embaraçosa, na maioria das vezes. Mas mesmo não tendo a resposta certa para essa pergunta, acabamos aprendendo uma lição importante: falar sobre a origem da vida é um assunto proibido... e assim permanece por muito tempo. Acreditamos também que a linguagem que temos é fiel ao que observamos, e que as pessoas nos dizem exatamente o que estão pensando, e que entendemos exatamente o que estamos ouvindo.

Isso acontece porque, como nossa percepção, a linguagem nem sempre é clara, e pode ser perfeitamente distorcida como a crença de que vivemos num mundo plano. Outro exemplo desta ilusão é a separação entre corpo e mente. É praticamente unânime a percepção que temos de que o corpo é algo real, concreto, manipulável, e a mente é algo imaterial, invisível e impalpável, embora nossas percepções do dia-a-dia nos mostrem que é assim mesmo (afinal, alguém já viu um pensamento por aí?). Mas existe mente sem corpo? Se nos basearmos nos conhecimentos científicos, a resposta é negativa. Pode haver corpos que não tenham mente, mas não pode haver mentes sem corpos. Portanto, a mente depende do corpo para existir, e faz parte do corpo.

A neurologia tem demonstrado que lesões no cérebro provocam alterações no comportamento. Isso pode ser observado no caso de acidentes com dano cerebral, que podem produzir dificuldades de raciocínio ou aumento da irritabilidade, chegando mesmo a modificações duradouras na personalidade. Mas é interessante observar que, apesar dos conhecimentos científicos, nosso pensamento comum separa de forma marcante a mente e o corpo, como se fossem duas coisas pertencentes a mundos distantes. Se mente e corpo fossem mesmo diferentes, e se a mente fosse imaterial, como ela faria para influenciar o nosso corpo?