Pós-graduações IMED 2013

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sexta-feira, 31 de agosto de 2012

O IDEB e os desafios da educação


Preocupantes os dados educacionais do último Índice de Educação da Educação Básica (IDEB). O Rio Grande do Sul apresentou uma estagnação da nota no ensino fundamental, e no ensino médio ocorreu uma diminuição do desempenho, de acordo com os resultados apresentados nesta semana.


Cabe então refletir sobre as causas deste desempenho fraco e sobre o que necessita ser feito para melhorar a educação, tanto no ensino fundamental quanto no ensino médio. São vários os fatores que geraram estes baixos índices, tais como as precárias condições físicas de ensino das escolas públicas, falta de renovação de acervo bibliográfico e investimento em mídias de ensino, além de problemas mais complexos, como a estruturação das matrizes curriculares e a remuneração dos professores. Mas isto não é novidade, pois há vários governos estamos nos defrontando com os mesmos problemas, e as soluções oferecidas são muito pontuais e transitórias. Se juntarmos a isso uma cultura brasileira imediatista e que não valoriza o ensino de excelência com o crescente número de professores sem estímulo intelectual e financeiro para desempenhar o seu trabalho, sem boas perspectivas de carreira, temos a tragédia instalada. Estão aí os números a confirmar.

Não é possível mudar a educação brasileira, aproximando-a de países destacados como a Coréia do Sul, sem alterações profundas e prolongadas. Mas para isso, é necessário rever muita coisa: a formação pedagógica de nossos professores, as propostas de currículo e, principalmente, a forma como o ensino acontece no dia a dia. Também é fundamental termos os pais como aliados no processo educacional, porque de nada adianta delegar para a escola tarefas que devem deles, pois também os pais precisam compreender e auxiliar o trabalho dos professores.

Tal como a educação dos nossos filhos, que não ocorre do dia para a noite, a educação dos nossos alunos também precisa ser inteligente, adequada às necessidades atuais e prevendo o que desejamos para nossos futuros cidadãos e profissionais. E não temos como delegar isso a terceiros, esperando por um milagre. Cada um de nós precisa ser o agente desta mudança hoje. Então, se você tem filhos, se você é estudante ou professor, pense e modifique a forma como está agindo, e faça isso dia a dia, hoje, amanhã, depois. Participe das reuniões de escola, converse com os professores e diretores, veja se a forma como a aula é ministrada faz a diferença na vida dos alunos, se pergunte se este é o melhor ensino possível. Não vai mudar amanhã, mas se o começo não for hoje, jamais acontecerá.

*Publicado no jornal Diário da Manhã, de 28 de agosto de 2012.

sexta-feira, 30 de março de 2012

A coincidência dos astros

Quando duas coisas ocorrem ao mesmo tempo, é bastante comum que pensemos que estes eventos possam estar relacionados. Se houver uma periodicidade entre eles, ainda mais certeza teremos de que, de fato, eles devem ter algum tipo de ligação, mesmo que esta ligação seja oculta.

Imaginemos que em determinado grupo humano vivendo no passado, num tempo onde a agricultura e a pecuária ainda estavam em processo de domesticação, alguém observa que sempre que as plantas começam o processo de brotamento, dá-se início à época de colheitas ou os rebanhos voltam a aparecer, uma determinada estrela aparece no céu ou o sol se põe num lugar específico do horizonte. O que de início é uma coincidência, com o passar do tempo e das gerações passa a ser um indicador de que a fartura está chegando.




Como a sobrevivência sempre foi e será um tema importante para a humanidade, ter a informação sobre este fato é fundamental. Assim, a cultura desta comunidade assimila que estes dois eventos estão relacionados.

O cérebro humano é programado para identificar padrões e, se eles não existirem, para criá-los, reduzindo, assim, a incerteza. Portanto, fica fácil imaginar que as estrelas, planetas, sol e lua não seriam apenas marcadores de eventos de fartura, mas que elas os provocariam. Afinal de contas, o grupo humano não possui bom controle sobre os eventos agrícolas e pecuários, mas a natureza pode ser capaz de determinar quando eles devem ocorrer. Deve haver uma vontade, além da vontade humana, que rege a natureza. E esta vontade pode ser a vontade das estrelas.

A astrologia nasce assim, da necessidade do homem em compreender e controlar o seu destino, pois se existe uma vontade superior que controla o comportamento das plantas e dos animais, por que seria diferente com o comportamento humano?

sábado, 24 de dezembro de 2011

Uma coisa por vez

Aquilo que intuitivamente já sabemos, ou seja, de que precisamos nos concentrar em poucas ou somente uma coisa por vez para fazermos bem-feito, foi comprovado. O neurologista Russ Poldrack, da Universidade do Texas, em Austin, refere que o cérebro humano não é capaz de processar de forma eficiente várias informações simultâneas, mas processa bem poucas informações por vez.


Esta informação tem importante impacto por exemplo no contexto educacional. Muitos educadores têm defendido o uso de tecnologias no processo ensino-aprendizagem durante aulas expositivas. Embora não se questione o mérito da utilização de novas tecnologias, fica em xeque a forma como a aprendizagem ocorre de maneira eficiente. Ou seja: se o aluno estiver numa aula com o computador, tablet ou conectado com outra tecnologia, seu conhecimento pode estar no prejuízo.

A psicologia cognitiva já apontou há vários anos que a atenção é o canal que permite que as informações sejam processadas pelas demais funções mentais, tais como a memória e o pensamento. Quando prestamos atenção em um objeto, ele é o "foco" de nossa análise. Assim, se existem distratores, essa análise acaba ficando a desejar, e o conhecimento não terá a mesma qualidade.

Voltando à sala de aula, o segredo não está na tecnologia propriamente utilizada para a construção do conhecimento, mas na sua forma e no conteúdo. Fica então um alerta: computador ligado em redes sociais, jogos ou outros distratores durante uma aula pode melhorar o relacionamento interpessoal, mas não favorece o aprendizado.

*Sugestão de leitura: Troques da mente, de Stephen L. Macknik e Susana Martinez-Conde

domingo, 20 de novembro de 2011

BOINC: computação pela ciência

Seu computador pode auxiliar na solução de vários problemas que afligem a humanidade. Quando ele estiver ocioso, é possível ser utilizado para processar informações obtidas em vários centros de pesquisa distribuídos pelo mundo.

BOINC é um programa que utiliza o tempo inativo do seu computador à ciência, a projetos como a busca pela cura da malária, SETI@home (busca de vida extraterrestre), Climateprediction.net, Rosetta@home, World Community Grid e muitos outros.

Depois de instalar o BOINC no seu computador, pode conectá-lo a tantos projetos quantos quiser.

Para conhecer mais e baixar o programa, o link é http://boinc.berkeley.edu/download.php
Colabore!

domingo, 27 de setembro de 2009

O mundo de Maya

O pensamento oriental ensina que o mundo é Maya, ou seja, é uma ilusão. Esse ensinamento pode parecer um contra-senso para nós, afinal vemos pessoas, prédios, carros, nos relacionamos e trabalhamos. Isso é uma ilusão? Não existe? Existe sim. Dizer que o mundo é uma ilusão não é dizer que nada existe, mas é afirmar que as coisas podem ser diferentes do que o que estamos vendo e sentindo.

Quanto uma pessoa tem depressão, por exemplo, não é ilusão o sentimento de tristeza que ela tem, nem a falta de energia para fazer as coisas. Ela também não é uma pessoa preguiçosa ou vagabunda, como os familiares ou ela mesma pode vir a acreditar que é. Se ela se apresenta nesse estado, é porque um conjunto de acontecimentos prévios favoreceu esta situação. Como dissemos já em outros artigos, os fatores genéticos possuem influência sobre os transtornos mentais, tanto quanto os aspectos relacionais. É nesse ponto, nas relações que estabelecemos, que as ilusões passam a existir.

Pesquisas em psicologia cognitivo-comportamental têm apontado que a pessoa que está com depressão percebe-se de forma negativa, percebe o mundo como hostil ou ameaçador e visualiza seu futuro com pouca ou nenhuma esperança. Isso significa que ela vê a si mesma, o mundo e o futuro de forma triste, sem perspectivas de mudança, porque sua tristeza acaba por prejudicar seu raciocínio. Então, mesmo que alguém tenha dinheiro, um bom emprego e relações afetivas satisfatórias, não vai conseguir se sentir bem porque não vai enxergar as coisas favoravelmente, e isso vai gerar mais tristeza, criando um círculo vicioso.

A medicação tem papel muito importante para restabelecer os neurotransmissores, que é uma das etapas do tratamento da depressão. Mas um tratamento somente com medicação não é suficiente, na maioria dos casos, para restabelecer a saúde mental. Nesse ponto é que entra o combate à Maya. Ao conversarmos com alguém com depressão, poderemos observar que ela vai mencionar que as relações que estabeleceu com pessoas importantes no passado nem sempre foram tranqüilas, e é bem possível que, de uma forma inconsciente, ela aprendeu que com ela as coisas não vão dar certo. É bastante comum ver que pessoas com depressão tiveram muitas cobranças emocionais de pessoas importantes, como os pais, e aprenderam que devem fazer tudo "certinho" para agradar essas pessoas. Como não temos o hábito de analisar nossos comportamentos e o comportamento de nossos pais em profundidade, geralmente é só quando se faz psicoterapia que se pode identificar que essas cobranças estão atrapalhando muito a vida do paciente. Muitas pessoas talvez não gostem da psicoterapia porque ela confronta nossas crenças e derruba ilusões: ilusão de que nossos pais foram bons para nós, a ilusão de que nosso emprego era tudo o que queríamos, e a ilusão de que o casamento que temos é o melhor ou o pior do mundo. Isso não significa que os pais, os companheiros e os chefes são os culpados pelo que acontece de ruim em nossas vidas: significa aceitar que eles são humanos, como nós, e acertam e erram, como nós.

Se é um processo doloroso derrubar as ilusões, reconstruir uma nova possibilidade de vida é trabalhoso. Mas nossas vidas são feitas de escolhas. Podemos escolher continuar sofrendo e não fazer nenhum tratamento. Podemos escolher só tomar a medicação. Podemos escolher continuar no emprego que nos dá um bom salário mas nos tira a noite de sono e a paz. Pasmem, podemos escolher ficar no casamento que temos, mesmo que ele seja horrível. Podemos escolher reclamar sem fazer nada, ou então aceitar passivamente sem reclamar nossas dores e sofrimento. Mas se optamos por desconstruir nossas ilusões, assumimos riscos: o risco de ter felicidade, o risco de ter liberdade, e o risco de comandar nossa própria vida.

*Este artigo foi publicado num jornal local em 2008.

sexta-feira, 16 de janeiro de 2009

O que é a ciência, afinal?

*Este artigo foi publicado no jornal O Rodinho, da IMED. Aqui reproduzo na íntegra o texto, que pode ser conferido também aqui.

Amigos, é com muita alegria que aceitei o convite d'O Rodinho para escrever uma coluna. E como não poderia deixar de ser, vou escrever sobre um tema que acho bem importante e ao mesmo tempo pouco conhecido: o que é a ciência.

O título desse artigo foi tomado emprestado de um livro escrito por Alan Chalmers, pela editora Brasiliense. Neste livro, o autor tenta responder a esta tão importante pergunta de uma forma clara e divertida, afinal a ciência não é uma coisa "chata", só para os iniciados; ao menos, não precisa ser desta forma. E essa é uma das primeiras visões que a gente tem da ciência, que ela é algo obscuro, cheia de fórmulas complicadas e incompreensíveis. É claro que a ciência tem uma linguagem própria, porque se ela busca compreender o mundo de uma forma mais clara e precisa, deve desenvolver mecanismos que possam atingir estes objetivos. Então não são todas as pessoas que compreendem a ciência, pois muitos não tem interesse em conhecer esta linguagem ou então, o que é pior, tiveram uma péssima primeira impressão da ciência, e querem estar longe dela.

Escrevi recentemente um artigo onde eu comparava a curiosidade da criança à do cientista. Os dois têm isso em comum, mas é claro que a curiosidade do cientista é mais refinada, porque para que ele possa responder as perguntas propostas, as questões não podem ser feitas de qualquer maneira. Também o cientista utiliza-se de um método específico para a ciência, que é chamado de método científico. Além de ser uma disciplina que ensina o aluno a "como fazer trabalhos acadêmicos", a metodologia científica se propõe a organizar as possibilidades de produção do conhecimento, para que aquilo que é investigado possa ser mais claro para os colegas cientistas. Mesmo porque o conhecimento científico é diferente do conhecimento da vida real (o senso comum), do conhecimento filosófico e do conhecimento religioso. A ciência busca ser clara em suas respostas, como dissemos, pois é essa clareza que permite que ela possa ser um conhecimento mais preciso.

Para esta precisão, as ciências utilizam via de regra a linguagem matemática, e aqui está uma coisa que faz com que os estudiosos das ciências humanas se arrepiem. Geralmente os pesquisadores das ciências humanas não gostam da linguagem matemática por várias razões: ora porque entendem que a matemática não pode explicar tudo, ora porque não tiveram treinamento para compreender o que significa uma informação matemática, ora porque não gostam mesmo de matemática. Muitas vezes essa crítica vira repulsa, que pode ser uma repulsa injustificada. Pode-se criar "pré-conceitos" contra a matematização das ciências sem uma base coerente para discutir esse comportamento.

Uma das críticas a isso é que a linguagem matemática seria "infalível e precisa". Não é isso o que acontece. Uma das ferramentas mais utilizadas nas pesquisas em ciências humanas é a estatística, e ela não lida com a precisão, lida com probabilidades. Ou seja, ela não diz: "As pessoas que perderam alguém importante fatalmente terão depressão", mas sim "É mais provável que alguém que tenha perdido alguém importante tenha depressão". Qual a diferença? toda. Pois no primeiro caso se está assinando uma sentença, enquanto que no segundo a informação dá uma condição de alta probabilidade, mas não de certeza. Portanto, atenção quando você ler uma pesquisa: ela não é definitiva. Pois se a pesquisa fosse definitiva, não haveria avanço no conhecimento científico (é por isso que a ciência vai se aprimorando, porque ela revê seus conceitos e conhecimentos).

Deveríamos ter o primeiro contato mais sólido com a ciência no ensino médio, mas também não é isso o que vemos como regra. Questionando as várias turmas com as quais dou aula, sempre tenho o costume de perguntar: "Vocês tiveram aulas em laboratório de química, física e biologia no ensino médio?" Cerca de 85 a 90 por cento dizem que não tiveram; e os poucos felizardos que tiveram, me dizem que foram uma ou duas vezes nos três anos, e ficaram assistindo, ou seja, não realizaram um experimento do início ao fim. Então, pergunto: como desejar que a ciência brasileira se destaque no mundo? Temos, sem dúvida, ótimos cientistas, mas estes são verdadeiros heróis, pois tudo foi contra sua vocação. Então, acaba que o primeiro contato com a ciência ocorre no ensino superior...

Acho muito importante que os alunos do ensino superior discutam e, principalmente, conheçam a ciência. É possível que este seja o último momento onde terão a possibilidade de discutir esse tema, pois depois que se formarem (exceção aos que quiserem a carreira acadêmica), provavelmente não terão mais esta oportunidade. Então, sejam críticos, perguntem aos seus professores qual é a base dos seus conhecimentos, e como este conhecimento foi produzido, pois tão importante quanto uma boa bagagem de conhecimentos técnicos, é fundamental ter um espírito crítico. E isso a ciência tem de sobra.

sexta-feira, 9 de janeiro de 2009

Camaleônidas



Grande Ser, agradecemos por este período bom. Somos criados à tua imagem e semelhança, embora pequenos e camaleões, porque és benevolente. Que teus olhos independentes olhem sempre por nós. Que possamos nos aproximar da tua infinita e perfeita capacidade de se adaptar ao ambiente, mesmo sem compreender exatamente como isso ocorre. Que todos os camaleões possam agir como se tivessem nascido da mesma ninhada, e que sejam cada vez mais camaleônicos e sensíveis, e tenha misericórdia daqueles seres que não nasceram com a perfeita capacidade de mudar de cor.

Reconhecemos que, embora pequenos, nos fizeste melhores que os outros seres porque podemos mudar de cor, e por isso utilizamos esta capacidade para lhe amar sempre mais e mais, e é por isso que tu nos ama. Foi tua infinita bondade que nos deu o mimetismo, que nos coloca acima das outras criaturas, porque este é o supremo dom da criação, e que possamos usá-lo para mostrar aos outros camaleões que tu criaste o universo e tudo o que nele há somente para que possamos nos adaptar a ele.

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

A necessidade da fé

Alguns estudos em psicologia evolucionista têm apontado que a fé em algo transcendente foi um elemento que ajudou a gerar vantagens evolutivas e, por conseqüência, refinar a complexidade da cultura humana. E isso tem razão de ser se considerarmos as necessidades básicas dos seres humanos, sendo uma delas a necessidade de amparo.

Biologicamente, os seres humanos possuem uma fragilidade constitucional desde a infância, de forma que necessitam receber investimentos de várias espécies: tempo, energia, alimento e afeto. Ou seja, nossa espécie depende primordialmente de outros que possuem habilidades que os membros imaturos não têm. Receber o amparo de um adulto que possui um "poder" dá tranqüilidade e reduz os efeitos do estresse sobre o organismo.

Entretanto, os adultos também possuem uma cota de desamparo, vinda de situações que não são previstas, como mudanças climáticas, doenças e o ataque de outros grupos humanos. Mas quem os iria socorrer? Já são adultos, sendo teoricamente poderosos. Neste momento, os mecanismos de desamparo são ativados, e surge um terreno fértil para o aparecimento dos seres superiores, mais poderosos que os adultos. Se as crianças buscam no adulto o amparo que falta, estes buscam em forças não visíveis os meios para superar as dificuldades.

Agregar na cultura nascente um agente sobrenatural poderoso dá força à comunidade. Mais força ainda tem o agrupamento que se auto-perceber como "escolhido" por essa força superior para ir adiante, sendo seus filhos prediletos em detrimento dos demais seres. Mas este desamparo constitucional, mesmo que baseado em necessidades não racionais, deve continuar sendo preenchido pela crença em algo invisível? Ou poderia a humanidade buscar bases mais racionais e objetivas para preencher esta lacuna?

sexta-feira, 19 de setembro de 2008

A ponte frágil

A física é considerada por grande parte dos cientistas como a ciência magna. Seus postulados são considerados como a pedra fundamental do conhecimento do mundo, e várias ciências importam esses saberes para compreender melhor seus objetos específicos de estudo.

Com as ciências humanas, ocorre situação semelhante. Pode-se observar que muitos conceitos da física são transpostos para o estudo do comportamento, da sociedade, da economia, mas é relevante nos questionarmos sobre como é feita esta transposição. Entendemos haver certa inconsistência neste movimento, pois há alguns problemas que nem sempre são adequadamente considerados.

O primeiro deles é a carência de conhecimento dos postulados da física por cientistas humanos. Via de regra, o cientista humano é especialista em determinada área do saber, sendo conhecedor desta com maior ou menor profundidade (e não podia ser de outra forma). Entretanto, como especialista nas ciências humanas, é importante considerar se possui os conhecimentos básicos de física que são necessários para realizar a transposição das idéias deste campo para o campo humano. Se ponderarmos que muito do conhecimento científico do cientista humano está vinculado ao conhecimento obtido no ensino médio ou de leituras de segunda mão da física, esse problema assume relevância.

Segundo, a diferença do objeto investigado exige que a transposição de conhecimentos seja realizada com prudência. Se na física quântica o objeto investigado é a partícula, nas ciências humanas não é. Portanto, pode-se pensar que o raciocínio pode ser forçado ao se querer aplicar as mesmas explicações que servem bem para um fóton para outro contexto e objeto, que é o comportamento humano.

Terceiro, os comportamentos humanos são efetuados por pessoas que são compostas de matéria, mas que não estão diretamente sujeitas aos fenômenos da física quântica. Ludwig Boltzmann (1844-1906) já asseverou em seus estudos de termodinâmica que a matéria se comporta de acordo com a estatística: as propriedades que vemos (extensão, volume, etc.) dependem da grande quantidade de moléculas que estão unidas e se comportam em conjunto. Não se pode considerar que a física do nosso dia-a-dia seja a mesma que a física quântica, porque não é; mas isso não significa que ela é melhor. Só é diferente.

Finalmente, muitos cientistas humanos parecem afirmar que a física quântica se aplicaria melhor do que a física clássica para explicar o comportamento. A física clássica é determinista e impessoal, enquanto que a quântica afirma que o observador interfere no fenômeno. Sim, isto ocorre. Mas podemos utilizar um princípio de semelhança como explicação? é legítimo afirmar que só porque um fenômeno ocorre no muito pequeno assim como ocorre no grande que tudo o mais também passa a valer? Só porque duas coisas são parecidas não quer dizer que estejam relacionadas ou que sejam explicadas pelo mesmo princípio. Além disso, a física, mesmo a quântica, não abre mão da tentativa de prever o comportamento das partículas, ou seja, ela possui um caráter de previsão, ao contrário do que os cientistas humanos gostam de afirmar (não é possível prever o comportamento).

Por óbvio que os conhecimentos produzidos nas demais ciências podem servir como inspiração para a pesquisa em outras áreas. Só não se pode assumir levianamente o que não se conhece, pois desta forma não se estará fazendo ciência de forma séria.

sexta-feira, 12 de setembro de 2008

O mundo newtoniano

Issac Newton (1643-1727) foi, certamente, um dos maiores cientistas de todos os tempos. Imerso numa época onde o pensamento aristotélico dominava a cena do conhecimento, propôs com sua genialidade uma visão revolucionária de mundo. Graças a ele se materializou na ciência o dito "Assim na Terra como no Céu", porque antes disso havia uma separação entre o mundo terreno, pecaminoso e imperfeito, e a esfera celeste supralunar, perfeita e divina, a morada das estrelas. Essa unificação permitiu uma visão harmoniosa do universo e alavancou o nascimento da ciência moderna.

Contudo, graças ao progresso científico e à colocação de novas questões originadas pela eletricidade e pela termodinâmica, no século XX o cenário científico modificou-se substancialmente. Uma nova física fez-se necessária para preencher lacunas deixadas pelos conhecimentos produzidos por Newton; paradoxalmente, esses conhecimentos exigiram ferramentas novas, mas trouxe a necessidade de uma revisão profunda no sistema de mundo newtoniano.

Os postulados da nova física fogem ao senso comum, propondo coisas como a impossibilidade de ver a matéria dissociada da energia: estes são dois estados que dizem respeito ao mesmo fenômeno. Descobertas como essa estimularam os pesquisadores das ciências humanas a importar estes princípios para a psicologia e a sociologia, por exemplo. Conceitos como entropia e complexidade hoje permeiam o discurso de vários pensadores, mas pode-se questionar se estes conceitos são adequadamente compreendidos e aplicados, pois mesmo na física há dificuldade para entendê-los.

O que pode agregar como conhecimento nas ciências humanas conceitos como a dualidade e a complexidade? Tem-se a impressão que os cientistas humanos preferiram superar a linguagem e os termos newtonianos para abraçar fortemente os novos conceitos da física, como que dizendo que os antigos conceitos foram totalmente ultrapassados, e termos como "complexidade" explicam melhor os fenômenos humanos do que os antigos termos da física. Mas cuidado: mesmo os físicos dizem que, para fenômenos ordinários e de baixa velocidade, a física newtoniana funciona, afinal, continuamos caindo mesmo que questionemos o que é a gravidade...

domingo, 30 de março de 2008

O recuo de Deus

Ao analisarmos a história das ciências, observamos que gradativamente o pensamento racional avançou no campo de conhecimentos menos precisos, o que permitiu uma modificação e um controle cada vez maior dos processos da Natureza e de como a compreendemos. Este movimento foi observado inicialmente no pensamento mitológico e depois se instaurou no campo religioso.

Por que ciência e religião entram, costumeiramente, em conflito? Porque ambas propõem explicações e métodos diferentes sobre como o mundo funciona. A ciência visa compreender e modificar o mundo a partir de evidências obtidas por experimentos, ou seja, o mundo precisa ser "testado" para que se veja como ele funciona. Na religião, esse critério é dispensável: não é obrigatório que a pessoa teste o mundo para explicá-lo, mas é fundamental a crença na ação de um agente superior. Portanto, o conhecimento é diferente porque o método de obtenção deste conhecimento é diferente.

O conflito começa quando a ciência busca testar temas que são considerados sagrados, como é atualmente o caso das células-tronco e da pesquisa genética com seres humanos. Esses assuntos encarnam as modernas discussões teológicas que antes tinham lugar na astronomia. Talvez hoje nem nos assombremos pelo fato de ter sido demonstrado que a Terra gira em torno do Sol, mesmo que nossos sentidos digam o contrário, mas nos séculos XVI e XVII esse pensamento causava um desconforto tão grande na forma como o mundo era percebido que os cientistas foram muito atacados. O tempo mostrou que a ciência venceu, porque ela testou a realidade.

Nesses movimentos da investigação científica, a idéia de Deus recua cada vez mais, e quanto mais a ciência caminha, parece haver cada vez menos espaço para este recuo. Se antes podia-se pensar que ele estava nos céus, hoje as explicações sobre Deus são diferentes, e se diz que sua presença se manifesta na física quântica, ou que ele é uma "energia" que permeia todas as coisas. Até onde esse recuo irá?

Na verdade, algumas questões precisam ser colocadas aqui. Quando se discute ciência e religião, religiosos podem combater a ciência como se ela fosse uma forma concorrente de crença, um tipo "diferente" de religião. Esse argumento não tem validade, porque o método que a ciência usa é a melhor garantia que se tem que o conhecimento obtido pelo experimento não vai se tornar um dogma. Podemos não acreditar na eletricidade, mas isso não vai impedir que ela continue existindo, independente de nossa crença. O grande trunfo da ciência é que ela se auto-atualiza, e faz isso baseando-se em evidências.

Depois, é fundamental separar duas características da religião: uma é a tentativa de explicar a existência das coisas, e a outra é o consolo que ela dá para o desamparo humano. Quanto se fala de ciência, é bastante clara a separação entre estas duas partes: as ciências duras explicam como as coisas funcionam, e a psicologia, como ciência soft, busca compreender de onde vem nosso sentimento de desamparo. Mas na religião, essa separação não é nítida. Ao mesmo tempo, ela responde a várias perguntas fundamentais: quem somos, porque existimos e qual é o sentido de nossa existência. Portanto, uma das coisas que torna a religião poderosa é que ela serve a múltiplos propósitos, coisa que a ciência não faz; as respostas que ela dá podem ser interligadas e, ao mesmo tempo, satisfazer muitas de nossas necessidades, não só a de conhecimento, mas a de sentido de existência e de afeto.

Apesar disso, é interessante observar que a religião muitas vezes deseja uma legitimação da ciência. Por que isso ocorre? Porque a ciência tem um tipo de conhecimento que a religião não possui, que é a possibilidade - e o fato - de manipular o mundo de uma forma mais precisa. Talvez isso mova muitos religiosos em direção ao pensamento científico, assim como muitos cientistas buscam uma aproximação com a religião visando respostas que a ciência não tem conseguido dar ou que julgam insatisfatórias.

Psicologicamente, a idéia de Deus tem muita influência, e talvez a última fronteira deste recuo seja a mente humana. De certa forma, podemos dizer que ela volta, ao fazer isso, de onde saiu. É possível que, em vista das necessidades humanas, ela encontre um abrigo seguro aí para sempre. Mesmo que haja pessoas que não acreditem na existência divina com base no que se sabe de ciência, grande parcela da população ainda necessitará da idéia de Deus lhe trazendo consolo e orientando seu comportamento.