É impressionante ver como a inteligência é um tópico que motivou pesquisas na psicologia. Pode-se dizer que desde sempre a humanidade identificou diferentes potenciais para o processamento de informações e a resolução de problemas; contudo, foram nos séculos XIX e XX que o tópico ganhou velocidade, graças ao nascimento da psicologia como ciência e da criação e aplicação de métodos quantitativos na pesquisa. Apesar disso, a inteligência ainda é um tópico muito controverso, que suscita algumas reflexões.
Em primeiro lugar, cabe definir o que é inteligência, e aqui os problemas mais ásperos começam. É fácil montar um teste "de inteligência", aplicar e corrigir, mas é difícil argumentar que aquilo que os resultados mostram é de fato algo chamado inteligência. Qualquer pessoa tem condições, consultando a literatura psicológica, de constatar que não existe uma definição sequer consensual. Uns definem como a capacidade de resolver problemas matemáticos; outros, problemas linguísticos, outros, para a utilização de ferramentas. Há pesquisadores que construíram hierarquias para estudar a inteligência, colocando alguns fatores como prioridade sobre outros. Desta forma, com esta profusão de modelos, fica difícil pensar em uma teoria geral da inteligência, mesmo porque "geral" é um termo que também precisaria ser definido com mais clareza.
Em segundo lugar, o que os testes medem? Habilidades. Quando montamos um teste psicológico, ele serve como ferramenta para averiguar o desempenho que uma pessoa tem sobre um conjunto de problemas. Se o teste visa identificar quanto tempo uma pessoa demora para montar um quebra-cabeças, esse teste pode ser chamado de teste motor; se diz respeito a responder preenchendo lacunas com as palavras adequadas, pode ser de lógica ou de linguagem. Mas mesmo que um teste mensurasse um número incrível de habilidades, mesmo assim ele mensuraria a inteligência?
Então, é perda de tempo estudar a inteligência? Não. O que talvez seja necessário fazer é uma revisão de definições. Estamos tão acostumados com termos como inteligência e personalidade, que fazem parte do nosso dia a dia, que temos dificuldade em definir o que eles realmente são. Talvez sejam termos que expliquem muito pouca coisa, ou mais tragam confusão do que clareza.
A evolução fez surgir em nossa espécie uma capacidade para solução de problemas, o que para muitos pode ser definido como inteligência. Mas a evolução nunca teve como propósito a construção da inteligência; ela aconteceu através das pressões seletivas ocorridas. Foram estas pressões, ao longo da existência dos nossos antepassados humanos e não-humanos, que nos dotaram com um conjunto de habilidades neurológicas que permitiram resolver diversos problemas relacionados com a sobrevivência: busca de alimento, proteção e reprodução. Assim, se definimos inteligência como o conjunto de habilidades para resolver problemas e compreender o mundo, podemos concluir que, na verdade, inteligência é um termo bastante genérico, e seu poder explicativo é artificial. E quanto mais genérico for um termo, mais impotentes serão nossos esforços para tentar defini-lo e estudá-lo com clareza. Isso explicaria, em parte, porque a "inteligência" é ainda um tema tão controverso.
3 comentários:
Permita-me arriscar uma definição de inteligência, ao seu crivo:
Inteligência é a capacidade de estabelecer o máximo de relações possíveis sobre qualquer fato ou objeto.
Olá Vinícius.
Gosto muito desse tema e essas questões a respeito do conceito de inteligência me fazem pensar na importância dos estudos de Howard Gardner a respeito das inteligências múltiplas. Segundo Gardner, a inteligência pode ser formada por diversas capacidades separadas, tais como a inteligência lógico-matemática,verbal, espacial, musical, corporal cinestésica, interpessoal e intrapessoal. Essa teoria propicia uma forma mais saudável de se pensar em inteligência, respeitando as habilidades próprias de cada indivíduo, valorizando que é possível existir uma área na qual seja mais habilidoso e evitando rótulos e armadilhas de uma quantificação de QI. abraço. Marcia
Márcia,
Se a inteligência é formada por várias habilidades separadas, então denominar o conjunto destas habilidades como "inteligência" significa construir uma denominação que apenas aglutina vários conceitos. Sendo assim, a "inteligência" por si só continua carecendo de definição operacional. Passa a ter somente uma definição empírica um tanto vaga, que não auxilia no estudo do conceito.
*Julgo que os estudos de Gardner fizeram uma contribuição muito relevante ao tópico, ao separar estas habilidades em conceitos operacionais que podem ser investigados.
ALLmirante,
Estabelecer o máximo de relações possíveis sobre qualquer fato ou objeto também considera as relações que não possuem nexo lógico?
Abraço.
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