Pós-graduações IMED 2013

terça-feira, 2 de novembro de 2010

A eficácia dos antidepressivos II

Seguindo os problemas apontados na postagem anterior, que mencionou que antidepressivos inibidores seletivos da recaptação da serotonina (ISRS) não seriam mais eficazes do que placebo, outro tema merece uma atenção cuidadosa pelos profissionais da saúde mental: os antidepressivos não funcionariam como se acredita que funcionam.

O modelo médico vigente de saúde-doença postula que o tratamento deve idealmente reestabelecer o funcionamento prévio do organismo; então, o objetivo da medicação é "normalizar" as funções que não estão equilibradas. Assim, o funcionamento de medicações antidepressivas deve-se ao fato de que a medicação aumentaria os níveis disponíveis de serotonina para os neurônios, facilitando o funcionamento das sinapses. Até aqui tudo bem, a não ser a falta de comprovação de que isto ocorre de fato.

Joanna Moncrieff, da University College London e David Cohen, da Florida International University, discutiram essa questão num artigo onde é proposto que antidepressivos criariam um estado "atípico" no cérebro. Este estado diferenciado é o que produziria os efeitos antidepressivos, de modulação do humor e redução dos sentimentos de tristeza e os outros sintomas da depressão.

O que sustenta esta tese? Os autores argumentam que haveria pouca evidência que sustenta que os antidepressivos reestabelecem os níveis normais de neurotransmissores - pesquisas não mostram, por exemplo, falta de serotonina (um neurotransmissor que seria relacionado à depressão) ou outras monoaminas em pessoas com diagnóstico de depressão. Estudos com animais também apresentam inconsistências, que referem-se especialmente a "o que" seriam os sintomas de depressão nestes animais. Estes argumentos, dentre vários, seriam suficientes para levantar a lebre.

Assim, os autores citados apresentam uma explicação alternativa para o funcionamento de antidepressivos. O modelo padrão é o centrado na doença, que explica que os antidepressivos funcionam porque reestabeleceriam os níveis anormais de neurotransmissores. O alternativo, chamado de "modelo centrado no medicamento", aposta que é a alteração cerebral provocada pelo medicamento o que traria um alívio dos sintomas. Seria mais ou menos como dizer que o álcool seria um bom tratamento para fobia social porque "solta" a pessoa.

Se o modelo centrado na droga se mostrar coerente, muita coisa vai mudar no entendimento e no tratamento dos transtornos mentais.